Edição de Sábado: Bolsonaro patrimonialista

Em meados de julho, no ano de 2019, um tema dominava as preocupações do presidente Jair Bolsonaro. Até ali, ele não havia ainda nomeado um embaixador para os EUA. Mas, naquele mês, o filho Zero Três completou 35, tornando-se apto a ocupar o cargo. E o presidente quis indicá-lo. A repulsa à ideia foi imediata no Congresso, na imprensa, entre cientistas políticos. Todos apontavam que Bolsonaro feria o princípio da impessoalidade. Ele não questionava a crítica. “Lógico que é filho meu”, afirmou em uma live. “Pretendo beneficiar filho meu, sim. Se puder dar filé mignon, eu dou.” Para o presidente, o ato de governar é pessoal. Após ser acusado pelo ex-ministro Sergio Moro de tentar aparelhar a Polícia Federal para impedir investigações a respeito de sua família e aliados, Bolsonaro quis indicar um amigo de família, o diretor-geral da Abin Alexandre Ramagem, para o comando da instituição. Novamente foi acusado de violar a impessoalidade do cargo. No STF, o ministro Alexandre de Moraes apontou que naquela nomeação havia o risco de “desvio de finalidade”. Ou seja, o novo diretor não estava sendo nomeado para dirigir a PF com independência, mas sim para tirar sua independência. Bolsonaro não se conformou. “Não engoli ainda essa decisão”, declarou à porta do Alvorada. Os exemplos são inúmeros.

Há um termo para isto: patrimonialismo. Ocorre quando há uma mistura entre o que é público e o que é privado. Esta mistura, de alguma forma, está no passado de todas as nações. Mas Estados modernos têm, entre suas características, a de reforçar a impessoalidade da administração pública. O governante não se utiliza de critérios pessoais para a escolha de auxiliares, não toma decisões pesando questões familiares e, claro, separa por completo o que é patrimônio privado e o que pertence ao Estado. No Brasil não é assim. O patrimonialismo faz parte da maneira como o Estado funciona. Jair Bolsonaro deixa explícito o que está lá desde sempre. E quem deu nome a esta característica foi Sérgio Buarque de Holanda, quando publicou, em 1936, seu livro Raízes do Brasil. É o patrimonialismo que sustenta seu principal conceito — o do homem cordial.

Sérgio vivia em Berlim, era correspondente dos Diários Associados, quando estourou no Brasil a Revolução de 1930. Adolf Hitler ainda não havia sido eleito chanceler, mas a República de Weimar já estava em plena decadência. O mundo se transformava, e a ascensão de Vargas após a queda da Primeira República levantava muitas questões a respeito do país. Por que o Brasil não conseguia se estabilizar? Neste princípio dos anos 1930 explodiu uma geração de intérpretes do Brasil, os primeiros a trazer conceitos de sociologia e antropologia que iam sendo adotados em todo o mundo para compreender o país. Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre, é de 1933, e nasceu dos estudos de Freyre nos EUA com o antropólogo Franz Boas. Sérgio Buarque, por sua vez, foi marcado por um sociólogo. Max Weber.

Em seu período de vida, Weber assistiu à sua Prússia natal se transformar. Houve a unificação da Alemanha, o governo de Otto von Bismarck, a decadência da monarquia, a Primeira Guerra e o nascimento de uma república liberal. Foi este período intenso de mudanças que o fez se debruçar sobre um problema: como se explica o Estado? O governo? Como surgiram todos estes sistemas de governar? Em uma série de escritos que depois foram organizados na obra Economia e Sociedade, ele se predispôs a criar uma teoria geral que pudesse abarcar a história da governança nas comunidades humanas.

Então começou a definir. Poder significa a capacidade de impor a própria vontade numa relação social. O Estado dá forma a uma comunidade humana e tem o monopólio do uso legítimo da força em seu território. E conforme Weber ia esboçando definições, foi percebendo que precisava de uma Teoria da Dominação. Porque há este fenômeno que se repete ao longo da história: uma pessoa ou um grupo clama legitimidade para mandar e uma comunidade obedece reconhecendo esta legitimidade.

O sociólogo alemão chegou à conclusão de que havia três tipos de dominação. Uma era motivada pelo Carisma. Há um líder particularmente persuasivo que inspira devoção pessoal e emocional por parte do povo. A segunda ele batizou de Tradicional — os hábitos de seguir estão enraizados num longo período de tempo, vêm de um passado remoto e o líder é seguido porque sempre foi assim. Por fim, o terceiro tipo de dominação é a Racional-legal, e extrai sua legitimidade de regras impessoais e princípios universais.

Tendo esta estrutura, Weber começou a encaixar os regimes em cada um dos três itens. A Dominação Tradicional, por exemplo, se divide em inúmeros estilos de comando espalhados pela história. Numa gerontocracia, o mais velho ou um conselho de anciãos manda. Em progenituras, é o filho mais velho nascido de uma determinada família. No sultanismo há um líder absoluto, cuja presença se impõe perante toda sociedade — valia para para as sociedades muçulmanas tradicionais, mas também para muitos regimes comunistas, incluindo o dos Kim, na atual Coreia do Norte. O feudalismo é outro tipo de dominação tradicional. Assim como o é o patrimonialismo. É um tipo de dominação que se distingue do feudalismo porque se dá num território bem maior, então é preciso haver uma estrutura burocrática de governo. Mas, para o governante, seus interesses pessoais e as obrigações públicas são uma só coisa.

Max Weber não imaginou estas divisões como estanques — são fluidas, se misturam, características de um e de outro podem se encontrar. Mas, ao ler sobre a ideia de patrimonialismo em Weber, Sérgio Buarque de Holanda teve um estalo. Ali começou a nascer sua definição do brasileiro como ‘homem cordial’ que, em sua vida pública, não faz distinção do que é da coletividade e o que é seu, pessoal. Segundo Weber, a maioria dos países europeus passou da fase patrimonialista na transição que se deu em vários séculos entre o regime econômico feudal para o capitalista. Sérgio percebeu que, no Brasil, este traço não havia sido superado. Escrevendo nos anos 1930, quando a República Oligárquica havia acabado de ser derrubada, ele viu o homem público brasileiro como uma pessoa criada num ambiente familiar, patriarcal. Os coronéis nordestinos, os quatrocentões paulistas, os caudilhos gaúchos. Esta estrutura impunha um estilo de dominação tradicional que, na vida pública, tinha esta característica. O patrimonialismo. A pouca diferença entre público e privado.

Se Sérgio Buarque de Holanda trouxe o termo para ajuda-lo a explicar o brasileiro, foi o advogado gaúcho Raymundo Faoro que construiu uma leitura de país inteiramente fincada neste conceito. Em 1958, lançou Os Donos do Poder, uma história da construção do Estado brasileiro a partir desta ideia.

Portugal, para Faoro, não havia vivido um feudalismo, lá predominou mesmo na Idade Média um sistema patrimonialista. Este jeito de governar foi transplantado para a colônia e reforçado quando a Coroa se mudou, em 1808, para o Rio de Janeiro. Neste patrimonialismo português, não era apenas o rei, mas toda uma elite administrativa que governava o vasto território que tratava o público como seu, pessoal. E, em cada momento de transição da história brasileira, este estamento burocrático trabalhou para manter seus benefícios.

Estamento é um termo importante para Faoro. Classes sociais dividem a sociedade em grupos que têm interesses econômicos distintos. Classes, dizia o velho jurista, negociam entre si. Mas estamentos representam outra forma de dividir a sociedade — uma baseada em posição hierárquica, em status. Estamentos não negociam. Sociedades divididas por estamentos são por natureza desiguais.

Para Faoro, o Brasil se modernizou permitindo que esta marca tradicional se mantivesse. Este corpo que administra o Estado, tanto políticos quanto funcionários públicos, se mantém distintos dos outros cidadãos, com benefícios que não cabem aos outros.

Os dois intérpretes brasileiros não concordavam de todo e há muitos críticos às leituras que ambos fizeram. O que não se questiona é que patrimonialismo existe no Brasil, é uma força entranhada na estrutura de governo, está por trás dos processos de corrupção, mas não só. A própria dificuldade histórica de estabelecer políticas de Estado, seguidas por um governo após o outro, se dá porque cada novo grupo no poder vê este exercício como um ato de vontade pessoal. Isto, ao menos, vinha lentamente mudando na Nova República.

Até chegar Jair Bolsonaro. “Quem manda sou eu.”

Leia mais sobre o patrimonialismo em Sérgio Buarque e Raymundo Faoro.

Covid-19 e o dilema da privacidade

Um dos grandes dilemas que surgem com a pandemia de Covid-19 é sobre até onde podemos ir no uso de tecnologia e dados para combater a doença, sem abrir mão de nossa privacidades. Aqui no Brasil uma das polêmicas está na discussão sobre se o IBGE deve ou não ter acesso aos dados existentes nas companhias telefônicas.

Miram Leitão: “A pandemia fez com que, em todo o mundo, houvesse a suspensão das pesquisas domiciliares. O problema é que em seguida o governo baixou a MP determinando que o IBGE tivesse acesso aos dados individuais que teriam que ser fornecidos pelas companhias telefônicas. Por ser uma MP, e pela maneira como foi feita, produziu uma onda de reação. Partidos diferentes, a OAB e outras instituições procuraram o STF, e a ministra Rosa Weber suspendeu o repasse de dados das telefônicas.”

Rastreamento de contatos é uma das principais medidas que permitiu a maioria dos países da Ásia a terminarem suas quarentenas. China, Coréia do Sul, Taiwan, Singapura e de certa forma o Japão estão todos utilizando tecnologia para coletar dados sobre o progresso do vírus de forma a guiar seus esforços de contenção. Entre eles o principal é rastrear quem está infectado e identificar outras pessoas que possam ter entrado em contato com o vírus. Um artigo publicado mês passado na Harvard Business Review detalha estes esforços e levanta a questão da privacidade, que é um ponto mais delicado nos países ocidentais.

Mas a própria tecnologia pode ser aliada para resolver este dilema. Essa semana Apple e Google, em uma aliança inédita, lançaram uma API que permite desenvolvedores criarem apps que utilizam o Bluetooth dos celulares para enviar de forma anônima sinais que podem avisar aos usuários que estiveram em contato próximo com alguém infectado.

Christina Farr, jornalista da CNBC, conta a história dessa inusitada aliança: “Um dos mais ambiciosos projetos da história da Apple foi lançado em menos de um mês e começou com apenas um pequeno grupo de funcionários. Em meados de março, com o Covid-19 se espalhando por todo o mundo, um pequeno time na Apple começou a trocar ideias sobre como poderiam ajudar. Sabiam que celulares seriam uma peça chave na resposta global ao coronavírus, especialmente na medida que países começassem a relaxar suas quarentenas. Para se preparar para isso, países e empresas estavam começando a criar aplicativos de rastreamento de contato para monitorar os movimentos das pessoas e determinar quem poderia ter tido contato com alguém infectado com o vírus. Em poucas semanas, o projeto da Apple já contava com dezenas de pessoas trabalhando e com apoio dentro da diretoria. No final do mês, o Google tinha se juntado oficialmente ao projeto e cerca de uma semana depois Tim Cook, CEO da Apple, teve uma reunião virtual com Sundar Pichai, CEO do Google, para fecharem a aprovação final do projeto.”

“A solução conjunta não é um app, mas uma API, uma série de especificações que outras empresas, e organizações de saúde, podem seguir para interagir com as funcionalidades do celular para criar seus próprios apps de rastreamento de contato. Funciona da seguinte forma, ao ativar o Bluetooth o usuário deve autorizar a troca de dados, a partir daí o telefone envia pequenos sinais anônimos que podem ser recebidos por outros aparelhos. Assim que um usuário sinaliza que teve um diagnóstico positivo de Covid-19, o app atualiza uma chave criptográfica que gera códigos que são enviados por Bluetooth e recebidos por outros telefones que estejam próximos. Ao receber um destes códigos o telefone notifica seu proprietário que ele pode ter sido exposto ao vírus. Isso permite que o aplicativo possa alertar pessoas que foram expostas, sem precisar saber suas identidades e sem permitir que essas identidades sejam armazenadas ou rastreadas por nenhuma autoridade central.’

Bill Gates e a pandemia

Em 2015, Bill Gates disse que seu maior medo era uma pandemia em um mundo globalizado. Em uma palestra no TED ele chegou a alertar por meio de números: se uma pandemia como da gripe espanhola — que matou cerca de 65 milhões de pessoas em 1918 — acontecesse no mundo de hoje, 33 milhões de pessoas poderiam morrer em seis meses. Quando veio a ebola ele publicou artigos alertando mais uma vez para o risco. Ele investiu em pesquisas em vacinas. E mesmo assim não estava preparado para a chegada do novo coronavírus.

Mas com o foco mundial em uma única causa, as inovações científicas estão acelerando. Para ele, “muito provavelmente” teremos uma vacina em 18 meses — o que seria um tempo recorde para um processo que normalmente dura em torno de cinco anos. Gates já doou US$ 250 milhões para a causa e reorientou a estratégia de sua instituição Bill & Melinda Gates Foundation para ficar totalmente focada contra o novo coronavírus. O que significa acompanhar e financiar algumas das 115 vacinas sendo desenvolvidas — sendo sete da sua fundação.

Em um artigo no seu blog, Gates identifica as inovações e estratégias eficazes sendo feitas para tratamento, testagem, rastreio e isolamento social. Por exemplo, o desenvolvimento de antivirais, testes rápidos que podem ser feitos em casa e a medida alemã de entrevistar todos os infectados para identificação dos seus contatos.

Para Gates, avanços desses tipos não serão apenas fundamentais contra o vírus de hoje. Em podcast da Vox, ele diz que as doenças infecciosas continuam sendo uma das grandes ameaças contra a humanidade. Mas a experiência atual pode nos preparar melhor para a próxima.

Bill Gates: “A gripe, que existe há muito tempo, mata em média 40 mil pessoas todos os anos. E a quantidade que não sabemos sobre a gripe é incrível. Não entendemos por que a gripe é sazonal. É algo tão profundo que há um período de três meses em que o vírus é muito ativo e quase nove meses em que é difícil encontrá-lo, dependendo do hemisfério em que você está. As doenças infecciosas não obtiveram a profundidade da [atenção] que, digamos, o câncer ou as doenças cardíacas, porque em grande parte são os países ricos que dirigem as prioridades científicas. Se você observar os países asiáticos que se saíram bem, muitos deles escreveram: primeiro passo, identifique todas as máquinas de PCR [máquinas de reação em cadeia da polimerase, usadas pelos laboratórios para copiar pequenos segmentos de DNA]. Etapa dois: obter suprimentos para as máquinas de PCR. Lugares como Taiwan ou Coréia do Sul, por terem sido atingidos por MERS ou SARS, tinham o manual. Eles abriram o manual, passaram por essas etapas e economizaram 10% do PIB e um imenso sofrimento humano ao lidarem com doenças respiratórias de maneira séria. O fato de uma nova doença infecciosa não estar nos EUA há tanto tempo nos permitiu não pensar nisso como uma prioridade. Você nunca vai levar as doenças zoonóticas — doenças que atravessam as barreiras entre espécies — a zero. Isso sempre será um risco e podemos nos preparar para esse risco. Você pode reduzir um pouco o risco tendo menos mercados úmidos e menos carne de animais selvagens, mas é muito difícil regulamentar nas áreas rurais da África Subsaariana. Se tivesse que dizer de onde será o próximo vírus, provavelmente será de lá. Isso é muito perigoso.”

Ouça aqui a entrevista da Vox.

E a palestra de Gates no TED em 2015. Assista.

As pandemias na literatura

Em outubro de 1918, uma delirante Katherine Anne Porter experimentou o que chamou de "a visão beatífica". Perto da morte do novo vírus da gripe que mataria entre 50 e 100 milhões de pessoas, Porter foi transportada para uma paisagem paradisíaca, livre da dor e do medo que haviam tomado conta de seu corpo. Para surpresa de todos, ela sobreviveu à doença e depois transformou a experiência em sua poderosa novela Cavalo Pálido, Pálido Cavaleiro. Essa história é uma das poucas obras literárias sobre a pandemia que matou mais pessoas nos Estados Unidos do que todas as guerras dos séculos XX e XXI combinadas. A experiência, disse Porter, "simplesmente dividiu minha vida ... levei muito tempo para voltar ao mundo novamente". O COVID-19 promete alterar todos nós. É um evento de mudança de paradigma que divide vidas e culturas em um antes e depois. No entanto, a literatura que surgiu da pandemia de gripe fala de maneira profunda sobre nosso momento atual: nas paisagens emocionais, nas maneiras como um momento passado reverbera no presente, na conversa inefável entre as experiências e nossa percepção do mundo. Porter codifica essas mudanças em um jogo de estilos, movendo-se entre uma linguagem alucinatória e onírica para transmitir a invasão de corpos pelo vírus e um estilo mais direto e realista para transmitir a guerra. Parte do desafio dos personagens é ler corretamente a história em que estão. Presos nesse paradigma, eles sentem falta da realidade que mudou, que o inimigo agora é invisível, que as mulheres enfrentam ameaças, que a frente doméstica é tão perigosa quanto as linhas de frente. Há consequências para a leitura incorreta. Mesmo depois que um dos personagens adoece, eles tocam, beijam e trocam cigarros, acreditando na história desatualizada, quando um novo delírio toma conta da narrativa e de suas vidas. Porter captura os solavancos emocionais e físicos de uma realidade em constante mudança e os riscos inerentes ao não se ajustar rapidamente o suficiente a um novo paradigma. A realidade de uma pessoa não muda simplesmente em uma pandemia - de fato, a incerteza é a realidade. A imprevisibilidade do vírus COVID-19 e tudo o que não sabemos sobre isso significa que não temos ideia de onde estamos na história ou mesmo em que história estamos. Essa é a primeira onda de algo ainda mais mortal por vir? Chegamos ao topo da curva? Qual é o escopo da tragédia? A economia é a história real? O que achamos que sabemos agora que pode ser fatalmente errado? A incerteza faz com que muitos de nós se voltem para ficção de gênero e filmes previsíveis (mesmo que sejam sobre desastres) - eles nos permitem reviver outra história como uma sombra num lugar onde já sabemos o final. T. S. Eliot, que junto com sua esposa pegou a gripe durante a pandemia, sentiu-se oprimido pelas preocupações de que sua mente tivesse sido afetada pela doença. The Waste Land - um poema sobre tantas coisas e que canaliza o maior zeitgeist de seu momento - transforma essa incerteza em um clima, com seus nevoeiros, sua paisagem doméstica assombrada por cadáveres, seu senso penetrante de viver a morte e sua linguagem delirante. W. B. Yeats capta esse sentimento de ameaça em A Segunda Vinda, um poema composto nas semanas depois que ele viu sua esposa grávida se aproximar da morte na pandemia. O vírus de 1918 afogou rotineiramente as pessoas em suas camas enquanto seus pulmões se enchiam de líquidos e causava sangramento repentino no nariz, boca e ouvidos. O senso de caos e horror do poema provém, é claro, de muitas causas, incluindo guerra, revolução e violência política da Irlanda, mas o poema também fala do terror de uma ameaça oculta e sem agente. A invisibilidade da ameaça, por sua vez, produz o que podemos chamar de culpa do contágio, um medo assustador de que uma pessoa possa passar uma infecção mortal para outra. No romance elegíaco de William Maxwell, They Came Like Swallows, que lembra a morte de sua própria mãe grávida na pandemia de gripe, os personagens são assombrados por todos os e-se: e se eles tivessem tirado o filho da escola mais cedo? E se eles tivessem escolhido o próximo vagão de trem em vez do primeiro? E se eles não tivessem entrado na sala naquele dia? E se aquele toque, aquela visita, aquela lavagem de mãos perdida prejudicar um ente querido ou um estranho? Virginia Woolf observa em seu ensaio On Being III como doenças e corpo são deixados de fora de nossa arte e experiências conscientes. Como escreve Woolf, "aquelas grandes guerras que [o corpo] empreende por si só ... na solidão do quarto contra o ataque de febre" não são registradas. As obras da pandemia pós-1918 codificam essas batalhas internas, às vezes diretamente e às vezes em fragmentos e ecos. Eles capturam a maneira como um vírus pode destruir as percepções internas do corpo, a maneira como a febre, a dor e o medo da morte transformam a realidade em delírio.

E os mais clicados, de mais uma semana curta:

1.Jornal Nacional: Uma linha do tempo das declarações de Bolsonaro sobr o Covid-19.

2. UOL: Bolsonaro acusa OMS de incentivar sexualidade infantil, mas apaga o post.

3. El País: Galeria — Na Espanha, crianças saem às ruas após seis semanas de confinamento.

4. Panelinha: Dicas de Rita Lobo para evitar o desperdício usando o congelador.

5. Youtube: Meio em vídeo: Ponto de Partida — Que presidente irresponsável.

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‘Mapa de apoios está desfavorável ao Irã e sua visão de futuro’, diz Abbas Milani

17/04/24 • 11:00

O professor Abbas Milani nasceu no Irã. Foi preso pelo regime do xá Reza Pahlavi. Depois, perseguido pelo regime islâmico do aiatolá Khomeini. Buscou abrigo nos Estados Unidos na década de 1980, de onde nunca deixou de lutar por uma democracia em seu país de origem. Chegou a prestar consultoria a George W. Bush e Barack Obama, numa louvável disposição de colaboração bipartidária. Seu conselho sempre foi o mesmo: o Irã deve se reencontrar com um regime democrático, secular, por sua própria conta. Sem interferências externas.

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